sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Primeiro meio - Capítulo XIII

CAPÍTULO DÉCIMO TERCEIRO
Mas, apesar de a necessidade de sofrer nos ter sido soberanamente imposta pela Natureza, apesar de esta ser a mais rigorosa condição e a lei mais absoluta a que ela nos submeteu, é de extrema importância para nós, segundo o pensamento de um Filósofo [no original latino, Nieremberg escreve: “Elegans Philosophus in hoc Eusebius ait: voluntarii labore, necesarii sunt laboribus in posterum eventuris, quos facilius tolerabit ille, qui sponte sua praexercitatus in ipsis fuerit”. Trata-se, portanto, de Eusébio da Cesareia (c. 265 - 339); ndt], que nos acostumemos a sofrer voluntariamente, a fim de formar em nós o hábito de sofrer sem pena aquilo que sofremos por necessidade. Assim, vemos o bastante que o remédio infalível contra os sofrimentos depende puramente de nós; por mais difíceis e duros que seja, a prática os torna fáceis de serem suportados, graças ao costume. E verdadeiramente, como as mordidas dos animais venenosos só são curadas pela aplicação mesma de seu veneno, assim também nós encontraremos um tão salutar antídoto. Os sacrifícios sofridos voluntariamente e de nosso bom grado adoçam e temperam aqueles que devemos suportar necessariamente. Mas esta lei natural não nos seria difícil e não sentiríamos repugnância por ela, se guardássemos algumas regras e medidas no sofrimento, se não nos fizéssemos mais infelizes do que realmente somos. Porque é certo que nossa miséria cresce bastante por nossa própria falta. Outro Filósofo teve muita razão em dizer que sofremos, em parte, porque ignoramos a verdadeira maneira de sofrer [no original latino, não encontramos nenhuma referência a este autor. Ao que tudo indica, esse “Filósofo” foi incluído pelo tradutor; ndt]. Aqueles que são os mais felizes devem curiosamente se instruir das misérias desta vida, para terem a vantagem de as conhecer e sofrê-las com menos dificuldade caso aconteça de serem acolhidos por elas e se lhes for impossível evitá-las. E, para falar seriamente, o que poderíamos fazer de mais razoável do que nos tornarmos sabedores do estado e das condições de nossa natureza? O que mais poderíamos fazer do que aprender que somos sujeitos à morte? Do que mais poderíamos tirar uma vantagem tão grande do que desta meditação tão salutar? Trabalhemos, portanto, para adquirir uma ciência tão útil e tão necessária, desacostumando-nos da reverência que temos pela Fortuna, aprendendo a suportar seus flagelos de tão bom coração como se os tivéssemos desejado.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 229-230.

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