terça-feira, 21 de setembro de 2010

Primeiro meio - Capítulo XXI

CAPÍTULO VIGÉSIMO PRIMEIRO
Ao exemplo de Abel se segue, num intervalo justo, o de Jó, que, por inocente e feliz que fosse, nunca acreditou que sua felicidade fosse perfeita se não vivesse alguma paciência, se ela não fosse revestida e decorada por um tão precioso ornamento. Certamente que ela só se encontra com maior satisfação e alegria entre os bons e os inocentes; é muito raro encontrar a justiça e a probidade entre as riquezas, entre as pompas e no luxo. Foi necessário que a constância desse homem excelente brilhasse mais pela sua adversidade; foi necessário que a perda de todos os seus bens, colocando sua paciência diante de uma última provação, a trouxesse à luz do mais belo dia, a fizesse aparecer no seu mais belo lustre. Assim como a virtude não saberia subsistir, não saberia viver sem o sofrimento – que é seu alimento natural –, sem dúvida alguma ela [a paciência; ndt] é tão mais obrigada e incomodada pelas delícias do que pela falta de alimento, por estar fora do seu elemento. É por isso que ela é a partilha das pessoas de bem. Um dos amigos de Jó certamente teve razão em lhe dizer que as aflições não vêm da Terra. Não é menos justo acreditar que, às vezes, elas vêm do Céu, elas partem de onde procedem os dons e as graças. Isso pode ser mais bem justificado pelos sacrifícios e sofrimentos dos bons e dos inocentes, daqueles que, estando ainda encerrados num corpo mortal, vivem como se já estivesse separados dele e livres, não se apegam quase nada à Terra e não se ressentem das enfermidades dessa vida.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 246-247.

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