CAPÍTULO DÉCIMO QUARTO
Sem dúvida um excelente meio de nos instruir na paciência é causar em nós mesmos sofrimentos voluntários; ou, se nossa coragem não nos permite chegar até a este ponto, pelo menos esperar constantemente aquilo que nos é necessário sofrer. Mas, trata-se de algo maravilhoso que as tristezas sendo, como são, tão frequentes na vida, que se possa quase contá-las por horas e momentos, sejamos acolhidos por elas antes que nos imaginemos capazes de chegar a elas. Nós só acreditamos que somos miseráveis quando a presença mesma de nossa miséria não nos permite ter nenhuma dúvida disso. É preciso, pois, nos prepararmos para o sofrimento dos males necessários, impondo-nos a sofrê-los de bom grado. Mas prestemos atenção de, nesse ponto, no aviso de Demócrito, que acreditava ser inútil aprender a sofrer, visto ser também preciso, ele dizia, necessariamente, que soframos e que, por meio disso, não aprendemos a nos proteger dos males. Certamente ele foi sábio e não encontrou nada que tenha sido motivo para o seu riso, tendo motivo justamente nisso. Ele deveria considerar que, ainda que essa aprendizagem não afaste de nós os males, é ela que nos concede, que nos traz este bem tão grande que é fazer com que evitemos as desordens onde a impaciência nos faria cair. Além do mais, é preciso lembrar que se alguém viesse a se formar na constância, a partir do exemplo de nossa fraqueza, aprenderia a se defender dos males da Natureza e da Fortuna; e nós, vendo isso, sentiríamos vergonha de nos vermos incapazes de tirar vantagem para nós mesmos de algo que foi usado por outros. Porque, falando mais claramente, os únicos verdadeiros males são aqueles que a impaciência nos suscita. Todo o resto é inocente para nós e também é incapaz de nos ferir, como se fosse uma espada em sua bainha. Portanto, somente a nossa opinião e a nossa impaciência é que nos fazem mal. Uma e outra atiram esta espada contra nós. E um Filósofo teve razão em dizer [no original latino não há referência a nenhum outro autor além de Demócrito; ndt] que o maior dos males é não poder sofrer o mal. Assim, sem uma tão necessária ciência, ser-nos-á impossível encontrar o repouso na vida; ela é apenas uma contínua matéria de dor e de problemas para quem não tomou o cuidado de se formar o hábito de sofrer.
NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 231-232.
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