segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Segunda proposição - Capítulo I

A ARTE
DE CONDUZIR
A VONTADE

LIVRO TERCEIRO
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SEGUNDA PROPOSIÇÃO
QUE é preciso que o Entendimento se defenda das imposturas da opinião e se corrija de seus abusos

CAPÍTULO PRIMEIRO
Mas, o Entendimento não seria capaz de se dispensar dos ofícios que deve à Vontade, nem lhe dar a menor segurança, se ele não se corrigir de dois defeitos de que ele é, ordinariamente, culpável na relação com ela: excitá-la com falsas imagens, que lhe fazem fazer esforços inúteis, e a fazem correr atrás de fantasmas; e apresentar-lhe bens sob uma aparência frágil e lânguida, que não apenas ela não é capaz de tocar, como também mais lhe causa desgosto do que lhe imprime desejo. É por causa desses dois inconvenientes que ela é privada da ajuda e do suporte que espera dele. Nesse sentido, descobriremos agora quais são os males que lhe vêm do primeiro, e daremos espaço também para mostrar as perigosas consequências que o outro traz consigo. Porque, ele tanto condena aquelas que merecem mais estima, como louva altamente aquilo que é mais digno de reprimenda. Às vezes, sua injustiça age até ao ponto de lhe cobrar o bem com o mal, e a lhe fazer tomar o mal como se fosse bem. Desta impostura, como se viesse de uma fonte envenenada e mortal, derivam todas as nossas penas e nossas infelicidades; por ele, concebemos horror por aquilo que deveríamos buscar ardentemente. E aquilo que, naturalmente e por si mesmo, seria o objeto de nosso amor, se torna o tema para o nosso ódio. Assim, falsificando tudo aquilo que nos dá, e nos persuadindo que há males onde não há, ele enche nosso espírito de terror, e nos faz sofrer todas as angústias que nos dão os males verdadeiros. Mas, há piores ainda: por uma maravilha desconhecida pela Natureza, essas angústias se mantêm e crescem através de seu contrário, pela representação e a imagem dos bens que havíamos esperado e que, depois, não encontramos, ou que, sendo encontrados de maneira diferente daquela que havíamos concebido ou estando acima de nossa opinião e de nossa expectativa, produzem em nós mais motivo para dor e para desespero e nos tornam, necessariamente, infelizes. Mas, cremos ser menos quando nos os obtemos? Saibamos que a Vontade, por ser plena e satisfeita, nem sempre é feliz. Esta aparência de bondade que vemos nas coisas, e que só é obra de nosso capricho, é extremamente frágil e delicada, é uma flor que se desfaz ao menor toque; que, bem longe de ter firmeza e dureza, não tem nem mesmo consistência; ela se funde e se perde entre nossas mãos; ela passa e escorre como a água; ela é outra quando a possuímos, diferente daquilo que acreditávamos quando a buscávamos. Acrescentemos ainda que o desejo e o temor só são separados por uma muito pequena distância; e, por assim dizer, só há um passo entre um e outro. Tão logo concebemos o desejo de uma coisa, começamos a temer sua perda, e então ela começa a nos causar inquietude. Sendo assim, que repouso, que satisfação podemos pretender dos bens? Se ele nos causam tanto sofrimento, seja na paixão por adquiri-los, seja na apreensão por perdê-los? Verdadeiramente, seríamos incapazes de estabelecer nisso uma alegria sólida. Por causa do mesmo engano da Fortuna – que nos faz supor bem o que é mal –, supomos prazer o que é tristeza. 

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 386-388.

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