quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Sexto meio - Capítulo I

A ARTE
DE CONDUZIR
A VONTADE

LIVRO SEGUNDO
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MEIOS infalíveis para adquirir a felicidade.
SEXTO MEIO
QUE é preciso vencer a repugnância que temos em agir bem, e nos esforçarmos para isso

CAPÍTULO PRIMEIRO
Mas, será inútil tudo aquilo que aprendemos acerca da maneira e das condições do instrumento que nos deve servir para realizar essa excelente obra sobre a qual meditamos, todo o cuidado que tivemos quanto a isso permanecerá sendo inútil se não formos além e não aprendermos, em seguida, qual é a maneira de empregá-la. E verdadeiramente é-nos tão necessário nos instruir acerca disso, quanto sabemos que um Operário só perderia seu tempo se lhe faltassem os princípios de sua arte. O Pintor seria grosseiro e desastrado se pretendesse traçar uma linha delicada apoiando o pincel. Se o Lapidador trabalhasse rudemente, quebraria a pedra que estivesse polindo; mas aqueles que batem o ferro, sem dúvida, fariam um trabalho inútil se não batessem com vigor, se apenas deixassem o martelo cair levemente ou se ficassem acariciando o prego. Quer dizer, há operações que exigem habilidade e outras que demandam força. A Vontade é como esta última: ela não vai em direção ao bem por seu próprio movimento, nem o abraça por ela mesma; ela resiste ao bem, ela se afasta dele; é preciso levá-la nessa direção com esforço. Esta vida foi, muito razoavelmente, comparada por um Poeta Grego a uma estação estéril e má, pela qual é difícil passar [no original latino, Nieremberg se refere ao poeta e dramaturgo ateniense Menandro (c. 342 a.C. – c. 291 a.C.); ndt]. É por isso que não somos capazes de praticar meios melhores para vencer na vida do que nos enchendo abundantemente de bens; não daqueles que servem para sustentar e para entreter a vida, mas de bens muito mais preciosos e que nos dão coragem e resolução. É isso, certamente, que nos faz ter a felicidade e que no-la dão a um título muito mais justo do que as riquezas, o luxo e as Volúpias seriam capazes de nos dar – que se atribuem, falsamente, a honra de nos conceder a felicidade; que são, para dizer mais ingenuamente, a matéria mais comum para nossos problemas, e para os acompanhamentos e as infalíveis sequências da miséria. Um grande coração não acha nada duro ou difícil. Os sofrimentos são o apanágio da Virtude; ela caminha com passo firme sobre os espinhos e sobre as brasas; qualquer que seja o passo difícil que tenha que dar, ela o dá com segurança e não deixa de avançar e caminhar sempre; ela é inimiga mortal da preguiça e da moleza. Se a liberdade é a mais preciosa de todas as coisas, como não há a menor dúvida, em que grau de excelência colocaremos a plena liberdade de nós mesmos – a felicidade –, visto que ser perfeitamente feliz, a bem dizer, é ser nada mais do que perfeitamente livre, conservar sua vontade livre da tirania das paixões? Para isso, é preciso esforço, que nada mais é do que um acréscimo de preço [à liberdade; ndt], tornando-a ainda mais preciosa. A doçura, que se encontra na posse desta última, recompensa muito bem a amargura de sua busca. 

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 335-337.

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