sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Sétimo meio - Capítulo IV

CAPÍTULO IV
Não nos dedicamos o suficiente a pensar nos prejuízos que ela nos causa; e não tivemos um grande cuidado em ver os bens que nos chegam da Diligência. Temos, sobre isso, dois quadros pintados com as próprias mãos da Natureza: a Cigarra e a Formiga. Aquela passa a vida cantando importuna e inutilmente; enquanto que esta se emprega em fazer provisões e sofre, sem descanso, para encher seus armazéns para quando o inverno chegar. A primeira, sofre a pena de sua negligência e recolhe, como fruto de sua ociosidade, a fome e a morte. A outra, pelo contrário, goza do bem que seus cuidados lhe oferecem e vive de forma feliz na prisão que o rigor do frio criou para ela. Esse pequeno animal – que, aparentemente, diríamos ser o refugo da Natureza, ou, pelo menos, um exemplo de seu desprezo –, reparando, por sua diligência, a infelicidade de sua condição, previne-se, sabiamente, quanto ao futuro. E, diferentemente dos outros que nada têm de certo e que só vivem para cada dia e que só se ocupam daquilo que é suficiente para entreter o ordinário da vida, ela [a formiga; ndt] é previdente, ela se enche daquilo que sabe de que precisará. E, certamente, podemos dizer com bastante razão que, entre todos, ela é a única que é rica, visto que ela o é pelas vias mais seguras que conduzem os homens à posse das riquezas – a vigilância e o trabalho. Através disso, a Natureza recompensou suficientemente aquela que, parece, havia sido rejeitada antes. Ela lhe fez bem suficiente, ao lhe conceder a capacidade para adquiri-los; e crendo, por isso, que poderia, sem nenhuma injustiça, se dispensar dos ofícios de mãe quanto à ela [quanto à formiga; ndt], ela [a Natureza; ndt] desocupou uma parte de seu cuidado e de sua providência, ao ver sua Diligência e a habilidade [da formiga; ndt]. A Fortuna usa, frequentemente, da sorte com os laboriosos e os vigilantes. Ela lhes tira uma parte de seus direitos e, partilhando com eles seus poder, ela quer que eles sejam autores de seu próprio bem, e que eles recebam de seus próprios cuidados as vantagens que os outros esperam de seu favor e de seu capricho.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 349-350.

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