segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Quinto prelúdio - Capítulo II

CAPÍTULO SEGUNDO
Talvez, estimemos a nossa vontade bem menos do que deveríamos, fazemos talvez pouco caso dela, não cultivando por ela sentimentos e o respeito que ela merece. Aprendamos que ela tem a vantagem de ter sido feita segundo o modelo mesmo da Divindade e, por isso, ter toda a sua extensão. Assim, por mais que as coisas que os homens consideram de forma mais alta e honram como se fossem bens pudessem fazer alguma coisa, elas nunca se igualariam a ela [à Vontade; ndt], e tudo o que conseguiriam é se envergonhar de sua pequenez. Sem dúvida, se abrirmos inteiramente o nosso coração, ele será ainda maior que tudo aquilo que pudermos colocar dentro dele. Que estranho seria se a roupa de um anão pudesse vestir um gigante! Se o Oceano estivesse seco, não seria suficiente um pouco de água para enchê-lo? Esse abismo só poderia ser preenchido pela posse de Deus. Nossa vontade poderia se satisfazer com uma gota de mel, com um fio de vento, com um pedaço de barro? Não é assim que se devem nomear as honras, as riquezas e as volúpias? Certo, visto que ela foi formada num tão alto padrão, como é a Divindade, não é de se estranhar que tudo aquilo que seja menos do que Deus seja menor do que ela. Uma vez mais: como é que esse espaço infinito, esse vazio tão grande e vasto, nossa vontade, poderia se satisfazer com coisas vãs e vazias? Certamente ela não conseguiria se sentir satisfeita senão de Deus. Somente Ele, que é todas as coisas, tem a medida do nosso coração. Se Ele não for suficiente, certamente as demais coisas todas serão ainda menos suficientes, visto que elas só poderiam enchê-lo por meio dEle, visto que Ele é todas as coisas juntas. Assim, portanto, nossa Vontade é extremamente extensa; ela é de uma capacidade e de uma grandeza tal que, para ela, tudo o que há de maior no mundo é muito baixo e muito pequeno; ela se eleva até ao Céu, ela pode se igualar à grandeza mesma de Deus.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 120-121.

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