segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Terceira máxima - Capítulo I

A ARTE
DE CONDUZIR
A VONTADE

LIVRO PRIMEIRO
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TERCEIRA MÁXIMA
QUE devemos amar as coisas constantes e aproveitar a mudança das que passam

CAPÍTULO PRIMEIRO
Mas, ainda que as únicas coisas que nos pertencem verdadeiramente devam ser o objeto de nosso amor, ainda que ele [nosso amor; ndt] só se ligue àquelas [coisas] que dependem da vontade e estão absolutamente dentro de nós, ainda assim, contudo, ele se dirige para fora de nós e sobre coisas que não estão em nossa jurisdição e pretendemos amar com segurança; às vezes até ele se permite confiar inteiramente nisso a alegria, porque elas são inocentes e não parecem apresentar motivo de apreensão de que possam causar desordem em nosso espírito. E mesmo que elas não estejam à nossa disposição, elas não nos devem ser, de forma alguma, suspeitadas de inconstantes e de infiéis. Não devemos ter escrúpulos no abrir-lhes nosso coração, porque elas são bastante firmes e seguras, porque elas tem menos chance de decair que nós mesmos. Todas as outras nos causam a perdição desde o momento em que as abraçamos; elas se tornam nossas inimigas tão logo se nos tornam caras; e como se a nossa afeição lhes comunicasse alguma maldade, elas nos fazem mal tão logo nós as amamos. Às vezes, mesmo aquelas que passam rapidamente e que parecem não ter nada que possa causar temor, são exatamente aquelas que não causam mais problemas; e o perigo é menor, para nós, no seu impedimento do que na sua fuga. Certamente a Fortuna não tem maneira mais perigosa de guerrear contra nós do que essa: ela só emprega coisas aparentemente frágeis e vis; mas é através dessas coisas que ela se torna mais digna de temor. Ela só tem por armas caniços frágeis e quebrados, mas ela conserta seu defeito pela habilidade com a qual se serve dessas armas; ela empresta sua maravilhosa destreza de maneiras a essas armas para suprir o que elas não têm de força. Ela combate como esses povos que, virando as coisas para o inimigo, lhe fazem mais mal do que se lhes mostrasse o rosto. Ela nos engana, disse o Abade Felipe [confira tag "Abade Felipe" ao lado; ndt], pela velocidade com a qual ela nos lança seus dardos. E para bem dizer, o amor que temos pelas coisas caducas e perecíveis aumenta e fortalece nossa miséria; e seguramente é desejar a ruína de nossa felicidade querer estabelecê-la sobre um fundamento tão arruinado. Sem dúvida, se nosso amor se liga a um objeto constante, ele segue sua condição e se tornará constante. Liguemo-la, pois, a Deus, em quem estamos certos de encontrar uma alegria eterna, com uma firmeza eterna. Não tenhámos escrúpulos de engajar todos o nosso coração em Deus, arrisquemos nEle nossa ousadia; encontraremos, sem qualquer risco de nossa parte, uma felicidade segura. Quem é que, tendo que guardar uma grande soma, não toma todos os cuidados necessários  para se garantir de qualquer perda? Ou não pediria um caução ou um empenho? Nosso amor é toda a riqueza de nosso espírito; tudo o que temos de valor e de preço é por causa dele. Ele constitui o fundamento e a medida de nossa estima. Vejamos, portanto, onde nos devemos guardá-lo, saibamos se ele pode encontrar firmeza nas coisas do mundo que ele abraça. Ele só encontrará essa firmeza em Deus. Portanto, coloquemo-lo somente nEle.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 167-169.

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