CAPÍTULO III
Quanto é a estima que temos pela vantagem de sermos absolutamente mestre de nossas vontades e de ter em nosso poder a realização de nossos desejos? É possível imaginar uma glória semelhante àquela de nos ver em uma condição mais nobre e mais eminente do que a condição dos Reis – a condição de possuir um Império mais extenso do que o próprio Universo e, para dizer em uma só palavra, a condição de possuir a nós mesmos? Seguramente que esta glória é tal que nada é capaz de se igualar a ela. Não seria, pelo contrário, uma deplorável loucura esquecer e trair de tal forma esta nossa dignidade, sujeitando-nos às nossas paixões, querendo depender da mais dura e mais cruel de todas as Tiranias? Imaginemos que se proponha aos animais a liberdade do homem com todas as suas prerrogativas; que se quisesse lhes dar a Razão de tal forma que uns moderassem seu furor e outros mantivessem sob freios sua cobiça; será que eles teriam alguma dificuldade em aceitar? Nós, por outro lado, recebemos gratuitamente a Razão e a liberdade; e, no entanto, fazemos tão pouco caso delas, a ponto de não sentirmos vergonha de vendê-las pelo mesmo preço que os animais não recusariam comprá-las; e, por uma infeliz e brutal emulação, tornando-nos mais irracionais e, às vezes, eu diria, mais animais que os animais mesmos, nós nos privamos voluntariamente de duas tão excelentes vantagens; nós nos tornamos indignos da grandeza de nossa condição, e de todos os privilégios que a acompanham, sujeitando-nos às nossas paixões. Perdemos a glória de um lugar na família do Céu; e, ao invés de sermos considerados com o augusto título de filhos de Deus, tornamo-nos apenas miseráveis escravos da Fortuna.
NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 319-320.
Nenhum comentário:
Postar um comentário