segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Terceiro meio - Capítulo X

CAPÍTULO DÉCIMO
Ora, nisso, é de extrema importância, para nós, não ignorar que há uma certa avidez de conhecimentos, um desejo insaciável de saber, que consiste em sempre se encher, sem nada produzir, em ajuntar uma infinidade de regras e máximas e nunca colocá-las em prática. Assim como o justo emprego do dinheiro é nos fazer ter as coisas que nos são necessárias, o direito e o legítimo uso da ciência é nos permitir adquirir a Virtude, nos fazer praticar o bem. Mas, como é o costume dos avaros esconder e enterrar seu Ouro, não se servindo dele nem dividindo-o com outros, eles pensam, eles aspiram incessantemente a novas riquezas; assim também, há homens que tendo adquirido excelentes conhecimentos e se tendo enchido de preceitos salutares, os escondem e os enterram em seus espíritos; e não cessando de buscar novas curiosidades, incorrem justamente no erro que levou um Filósofo a censurar os Atenienses de usar seu dinheiro apenas para calcular [No original latino, Nieremberg escreve: "Dicam de iis, quod Anacharsis de Atheniensibus, nummis ad numerandum dumtaxt uti". Trata-se, pois, de Anacársis, um filósofo cita que viveu no século VII a.C., de quem se sabe muito pouco a respeito; ndt]. O que pensamos que seja a riqueza de um Avaro? Ela não é mais do que uma magnífica pobreza. Eu vos pergunto ainda mais, o que é do saber de que nada se pode aproveitar? Ou uma sabedoria louca? Por mais cheios de bens que sejam os avaros, podemos dizer, seguramente, que eles são os mais pobres de todos os homens; e podemos dizer também que não há ignorantes maiores do que aqueles cuja ciência, por profunda e universal que seja, nada produz, não traz fruto algum. Como a natureza se contenta com pouco e não há muitas coisas que sejam necessárias para a vida, a prática da Virtude não tem necessidade de muitas regras; e se se fazem, todos os dias, Livros, se se fazem tantos Volumes sobre isso, não é para que nos a abracemos, mas apenas para excitar nosso querer. Aqueles que sofrem para nos fazer bons imitam aqueles que jogam dados; como nossa conversão e nossa emenda é seu objetivo, como eles querem nos ganhar, eles buscam todos os meios para isso, eles tentam frequentemente a Fortuna para ver se têm algum sucesso; eles jogam os dados várias vezes para ver se conseguem uma boa soma de pontos; eles arriscam muitos discursos para tentar nos persuadir. Assim, certamente, nos é necessário pouco para praticar a virtude, mas nos é necessário muito para que nos resolvamos. Ajuntemos a isso, para a confusão daqueles que tornam inúteis, por covardia, suas luzes e seus conhecimentos, para os sábios ociosos, que eles são ainda mais ridículos do que aqueles que guardam seus tesouros; o dinheiro se consome com o uso; ele pode ser corrompido e pode ser falsificado; enquanto que o saber que se coloca em prática e que se emprega em fazer o bem conserva não apenas o seu valor, como também adquire, todos os dias, mais valor e se torna ainda mais precioso.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 309-310.

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