quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Segundo meio - Capítulo IV

CAPÍTULO QUARTO
Não há nenhum refúgio, não há nenhum asilo para o infeliz que ela faz sofrer e que ela persegue; ele não seria capaz nem mesmo de encontrar em si mesmo o suporte e a defesa contra si. Por mais inexpugnável que seja a muralha que o cerca, por mais forte que seja a guarda que vela noite e dia por ele, e por mais que ele tenha tudo o que poderia desejar para sua perfeita segurança, infelizmente ele nunca estará seguro. Ele só está verdadeiramente em paz fora; mas, se está dentro, estará sempre com problemas, estará eternamente em guerra. Ele não teme cair nas mãos dos ministros da justiça e experimentar o rigor dos suplícios que ela ordena; mas ele sofre uma pena interior mil vezes mais dura do que o muro que o cerca, que o mantém prisioneiro de si mesmo. Sem dúvida, há cadeias mais rudes que ele não poderia evitar. Como é deplorável a sua condição! Ele pode dobrar um Tirano, ele pode encontrar sua piedade, mas não a poderá encontrar dentro de si mesmo. Eis o horrível suplício que um famoso Bárbaro praticava [no original latino não há referência nominal a este bárbaro; ndt]: por um prodigioso e novo meio, afligia os homens, reunindo em todas as suas partes os corpos vivos com os corpos mortos, a fim de que a corrupção desses ganhasse a vida daqueles, fazendo durar ao máximo o sentimento da morte, até ao ponto de ela se produzir necessariamente. E tornando-o longo, ele tornava ainda mais cruel esse suplício. E eu vos pergunto, se pode haver comparação mais adequada com o remorso que o pecado nos causa? Ele é como uma carniça fedorenta que nos é amarrada e que nos dá a sensação de uma longa morte. Eu chamo assim à negra e profunda tristeza com a qual ele nos aflige. Em todos os outros males, cada um é seu próprio consolador, a razão os alivia ou, pelo menos, os tempera; mas ela dá novas forças a ele, ele recresce, se irrita através daquilo que os outros receberiam atenuações.

NIEREMBERG, Jean Eusebe. L'art de conduire la volonté selon les preceptes de la Morale Ancienne & Moderne, tirez des Philosophes Payens & Chrestiens. Traduit du Latin de Jean Eusebe Nieremberg, Paraphrasé & de beaucoup enrichy par Louys Videl, de Dauphiné. Dedié à Monsieur de Lionne, Conseiller d'Estat ordinaire & Secretaire des Commandements de la Reyne Regente. Paris: Chez Jean Pocquet, 1657, pp. 282-283.

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